Tuesday, June 07, 2005

O eterno retorno


Os velhos mitos e as pequenas verdades não desaparecem nunca, não é mesmo? E o triste é que eles não existem por si só; não são partes fundamentais da realidade, e nem essenciais pra coisa alguma Trocando em miúdos: os velhos mitos e as pequenas verdades estão ligados à realidade como que por uma solda da cultura. Essa ligação forçada, artificial, vai se repetindo, ao longo das gerações, como se fosse um texto de teatro, que em determinada data deve ser representado—em nome da tradição.

O estigma do “bode expiatório” é um exemplo clássico e cheio de vida.
As cabeças pensantes, quando querem dar um sentido para a História, armam um lindo esquemão de encadeamento de fatores; e vão buscar, não no pensamento, mas em um único pensador, a matéria-prima, a primeira fagulha para armar o esquema escamoso.
E fica assim, tudo muito bonitinho e jeitoso. E o melhor de tudo: você tem a quem culpar (uma cabeça) pelas mazelas de um pedação do processo histórico. Simples, prático e eficiente; isso não é demais?. E a revolta, inevitável para quem quer que analise a Historia, fica assim muito bem direcionada.
É engraçado, por exemplo, pegar Nietzsche, aquela coisinha maguinha e frágil (parece uma rã), e culpá-lo por portentosos estragos no Ocidente. Então, eu tenho o pensamento, o pensador-o bode, e uma série de fatores concretos e históricos para fazer ligações e “click!”, entender toda a realidade que me cerca—ô sabor! É como um daqueles joguinho de montar, que nossas titias davam de presente e diziam: “É um brinquedinho que estimula a inteligência, fio!”
E o passado? Digo, a época anterior ao nascimento do bode-expiatório-cabeção, é pintado como um paraíso fenomenal, pois sim—a verdadeira festa das luzes, onde todos eram felizes e saltitantes. Até, é claro, a chegada daquela maldita cabeça na aldeia.
Porque, vocês não sabem? O livre pensamento não existia naquele passado remoto, e não existia uma pessoa sequer contaminada com essa praga. É tudo culpa da cabeça...e dos malditos livros que ela escreveu.

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